O Livro de Lamentações


Por que é que a poesia é escrita? Se calhar a maioria de nós pensa em poesia como algo romântico, algo que um apaixonado (mais lamechas) declama para a sua amada. Mas a verdade é que a poesia é usada para tratar de muito mais do que de amor. Prova disso é o livro de Lamentações, um conjunto de poemas usados pelo seu autor, não para exprimir amor, mas antes, como o título antevê, para exprimir dor e tristeza.


Apesar de tradicionalmente ser dito que foi escrito pelo profeta Jeremias, não há nada na Bíblia que confirme isso, assim é anónimo. No entanto, os poemas foram escritos por alguém que passou pelo trauma de ver a sua cidade, Jerusalém, destruída. O autor começa o livro por descrever como Jerusalém, uma cidade que dantes era cheia de vida e alegria, se encontrava vazia e em ruínas.


Como é que aconteceu uma coisa dessas? No ano de 586 a.C. o império babilónio atacou e conquistou Jerusalém. Já por duas vezes eles tinham subjugado o reino de Judá e a cidade, Jerusalém era a capital do reino, e por duas vezes eles tinham-se revoltado contra os conquistadores. Agora a paciência dos babilónios terminara. Assim, quando conquistam novamente a cidade, são bastante mais selvagens no ataque aos seus edifícios e cidadãos, inclusive levando boa parte deles para longe da sua terra. Por isso, nos poemas de Lamentações, a cidade é uma ruína silenciosa.


Mas se os babilónios são a causa última do estado da cidade, a verdade é que o escritor de Lamentações reconhece que não são a causa base daquele sofrimento. Aquele povo sofre devido ao seu próprio pecado, porque desobedeceu a Deus. Este é um alerta: quando nos afastamos de Deus e fazemos escolhas erradas, isso pode trazer consequências dolorosas.


No entanto, os poemas não nos deixam apenas lamento pela situação e pelo pecado. Embora seja apenas um pontinho de luz no meio das trevas descritas pelo poeta, também há esperança em Lamentações. De facto, a meio do livro, nos versículos 3:22-66, lemos um poema de convicção na bondade de Deus e na certeza de que Ele não abandona os que ama, mesmo que eles mereçam. O início desse poema é particularmente belo: “A compaixão do SENHOR por nós não se esgotou ainda, o Seu amor não chegou ao fim. A Sua bondade é renovada cada manhã e grande é a Sua fidelidade.” (Lamentações 3:22-23, BPT).


Em resumo, temos de ver o livro de Lamentações pelo que ele é, um livro de dor, dor real e semelhante àquela que muitos cristãos sofrem hoje em dia. Temos que receber o seu impacto. É um livro que nos faz meditar sobre as consequências do pecado, como ele é morte e destruição. Mas também é um livro que nos mostra Deus connosco na dor, e de braços abertos para perdoar. Lamentações é um livro que nos faz olhar para a cruz, porque lá vemos o sofrimento de Jesus e lá vemos o perdão de Jesus. O amor de Deus nunca falha, mesmo nas trevas mais negras.


David C. Miranda

Pastor - Soure e Montemor-o-Velho (Missões AD Coimbra)